MPSC denuncia 14 pessoas na compra dos 200 respiradores

MPSC denuncia 14 pessoas na compra dos 200 respiradores

25 de agosto de 2021 Off Por Editor



  • Os empresários teriam formado uma organização criminosa para, contando com a negligência de agentes públicos, vender ao Estado de Santa Catarina, com pagamento adiantado, respiradores pulmonares que não tinham como entregar, lesando os cofres públicos em R$ 33 milhões. Ao todo foram denunciadas 14 pessoas. Por conter informações em sigilo, a ação foi protocolada em segredo de justiça.

    O Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) ingressou na Justiça com uma ação penal para punir 14 pessoas – empresários e agentes públicos – por uma série de crimes praticados na venda de 200 respiradores pulmonares não entregues ao Estado de Santa Catarina, o que lesou os cofres públicos em R$ 33 milhões. A denúncia foi protocolada na Vara Criminal da Região Metropolitana de Florianópolis na tarde desta quarta-feira (25/8).

    Os empresários denunciados vão responder por organização criminosa, estelionato, falsificação de documento particular, falsidade ideológica, uso de documento falso e lavagem de dinheiro. Um ex servidor responderá por estelionato e obstrução da investigação. Uma servidora responderá por peculato culposo, uso de documento falso e obstrução da justiça. E os demais servidores responderão por peculato culposo, por terem sido supostamente negligentes.

    A Operação O2 foi deflagrada em maio do ano passado pela força-tarefa composta pelo MPSC, Polícia Civil e Tribunal de Contas (TCE). Dividida em duas fases, a operação colheu mais de 50 depoimentos e cumpridos 51 mandados de busca e apreensão e cinco de prisão preventiva.

    Um mês depois, em junho do ano passado, os autos da investigação foram remetidos para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), que apurou os fatos durante um ano. O STJ devolveu a apuração para a força-tarefa catarinense em julho desse ano.

    ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA

    De acordo com a ação penal, uma suposta organização criminosa teria sido constituída para que seus membros obtivessem vantagem patrimonial aproveitando-se da necessidade urgente de aquisição de equipamentos e materiais por entes públicos e privados para o enfrentamento da pandemia de coronavírus. A organização criminosa seria chefiada por um dos empresários, que contou com auxílio direto de um agente político.

    Os empresários ofereciam para a venda respiradores pulmonares que não existiam. Naquele momento esses equipamentos eram essenciais para o tratamento de casos graves de covid-19 e, por isso, extremamente escassos e com valores muito elevados na ocasião. A negociação envolvia a exigência de pagamento antecipado. Utilizando os mesmos métodos, o grupo também negociava com entes públicos e privados de outros estados.

    Especificamente no caso de Santa Catarina, a suposta organização criminosa teria tido como elo com o poder público um agente político, e contado com a atuação facilitadora uma servidora pública.

    Além dos empresários que integravam a organização criminosa, outras pessoas participaram direta ou indiretamente da negociação e foram denunciadas de acordo com a participação na fraude.

    As provas coletadas no curso da investigação, que por um ano foi conduzida pelo STJ, mostram que o procedimento administrativo de compra dos respiradores pulmonares (PSES 37070) foi instruído com duas propostas falsas, de modo a assegurar a contratação da empresa pertencendo à organização criminosa.

    A ação penal foi assinada pelos Promotores de Justiça que integram a força-tarefa O2 – as Promotoras de Justiça Isabela Ramos Philippi, Lara Peplau e Marina Modesto Rebelo e os Promotores de Justiça Maurício de Oliveira Medina e Alexandre Graziotin – e pelo Promotor de Justiça Thiago Carriço de Oliveira, que responde pela 26ª Promotoria de Justiça da Comarca da Capital.

    A denúncia agora será analisada pelo Juízo da Vara Criminal da Região Metropolitana de Florianópolis. Somente após o recebimento pelo Poder Judiciário os denunciados passam a ser réus. Por conter informações em sigilo, a ação foi protocolada em segredo de justiça.

    De acordo com a ação penal, um grupo de empresários se aproveitou do momento mais crítico da pandemia e estruturou uma organização criminosa para obter vantagens. Esse grupo tentou vender respiradores que não tinham para o Hospital Albert Einstein, de São Paulo, para a empresa RTS Rio S/A, para a Prefeitura de Barueri/SC, para a Associação Cultural Floresta, de Porto Alegre, para o Estado do Amazonas e para a Secretaria de Estado de Saúde de Santa Catarina. Apenas a Secretaria de Saúde catarinense fez negócio com o grupo.

    22 de março de 2020:

    Em trocas de mensagens, um agente político indica integrantes da suposta organização criminosa como fornecedores que poderiam atender a demanda do Estado por respiradores. Nesse mesmo dia, uma servidora pública recebe o prospecto e uma foto de respiradores pulmonares.

    22 a 25 de março de 2020:

    Uma série de contatos entre a servidora e o empresário é estabelecida para um ajuste de venda de respiradores pulmonares ao Estado. Nessas ocasiões, o empresário afirma que dispunha de 500 respiradores para pronta entrega e destaca a urgência no fechamento do contrato, já que a demora resultaria na venda para outro interessado.

    25 de março de 2020:

    O empresário negocia com a servidora 200 respiradores pulmonares para pronta entrega, ao preço unitário de R$ 169 mil.

    Um agente político intervém, obtém a redução do preço para R$ 165 mil e determina servidora que feche a compra com o empresário.

    Diante do acerto verbal, empresários elaboram uma proposta recorrendo a um empresário idôneo, que desconhecia o ajuste ilícito. Nessa noite, uma proposta é encaminhada à Secretária da Saúde.

    26 de março de 2020:

    Inicia-se processo de dispensa de licitação para a aquisição direta dos bens.

    O empresário que não sabia que o negócio seria uma fraude foi contatado pela organização criminosa para que pagasse R$ 3 milhões em propina. O empresário recusou-se a participar da ilegalidade e abandonou o negócio.

    Passam a integrar, então, integrantes da empresa registrada no nome de um “laranja” e que vai vender os respiradores que não existem para o Estado.

    Nessa noite, uma proposta em nome dessa empresa, não assinada, é encaminhada pelo grupo de servidores.

    27 de março de 2020:

    O empresário, líder da fraude, solicita a substituição da proposta enviada dois dias antes por outra proposta, não assinada, e passa a cobrar o depósito dos valores adiantados para a entrega dos equipamentos.

    Iniciada a dispensa de licitação, a Assessoria Jurídica da Superintendência de Gestão Administrativa lança um despacho no processo administrativo de compra indicando a necessidade de juntada de mais dois orçamentos de outros fornecedores, a fim de demonstrar a adequação do preço ao mercado.

    28 de março de 2020:

    A servidora faz contato com o empresário e solicita dois orçamentos. O empresário contata seus parceiros e estes enviam orçamentos falsos à Secretaria de Estado da Saúde.

    1º de abril de 2020:

    O Estado de Santa Catarina efetua o pagamento de R$ 33 milhões à Veigamed para o fornecimento de 200 respiradores pulmonares Medical C35, os quais jamais foram entregues.

    3 de abril de 2020:

    O pagamento feito pelo governo efetivamente entra na conta bancária da empresa que até hoje não entregou os respiradores para o Estado.

    Próximos passos do processo judicial

    O Juiz da vara criminal da região metropolitana de Florianópolis irá analisar se recebe (aceita) ou não a denúncia, que é a ação penal proposta pelo MPSC. Nessa análise, ele avalia se a denúncia atende aos requisitos legais, ou seja, se o MPSC, por exemplo, demonstrou que há provas suficientes para o início do processo e se a peça narra os fatos de forma satisfatória.
    Após o Juiz decidir pelo recebimento da ação penal, os envolvidos deixam de ser acusados e passam a ser réus. Inicia-se o processo e os réus são citados (chamados) para se defender.
    Os envolvidos começam a rebater as acusações com justificativas embasadas em documentos e indicam testemunhas.
    O Juiz analisa tudo e pode absolver sumariamente (sem ouvir mais ninguém) os réus ou designar uma audiência de instrução e julgamento.
    Na audiência de instrução e julgamento são produzidas mais provas, as testemunhas são ouvidas e pode haver até “acareações” – os envolvidos ficam frente a frente para o confronto de versões.
    No final da audiência são oferecidas as chamadas alegações finais – tanto defesa quanto testemunhas se manifestam para demonstrar as suas versões do fato.
    Após as alegações finais, a ação penal está pronta para o Juiz anunciar a sentença.

    Com informações MPSC